domingo, 7 de abril de 2013

A carminhada do Frei Renato


E aconteceu no seu falar e debater [dos dois discípulos que caminhavam para uma aldeia, de nome Emaús], que o próprio Jesus se aproximou e caminhava com eles. Mas os seus olhos estavam controlados para que não o reconhecessem. Foi reconhecido por eles no partir do pão” (Lc 24, 15-16. 35)


Olá! Pediram-me para que escrevesse uma crónica acerca da Carminhada e imediatamente disse: vai demorar! E demorou mesmo! Mas, ainda bem que demorou! Primeiro, porque, só à distância, conseguimos ver melhor, não o pormenor, mas o conjunto, o todo, a mensagem, o sumo, o essencial. Depois, porque é diferente escrever antes de escrever depois de ler o Evangelho que a Igreja nos propõe hoje: o relato da caminhada dos discípulos de Emaús.
Primeiro, as diversidades. Foi a primeira coisa que me saltou à vista. Uns daqui, outros de acolá. “O que será que isto vai dar?”, dizia eu, inexperiente nestas coisas de Carmo Jovem, cá para mim. E eram muitos: Avessadas (GPS, Flores do Carmelo, 9º e 10º ano de Catequese), Paços de Gaiolo, Viana do Castelo, Moinhos da Gândara (e depois, também, Braga e Aveiro). E, para mim, a maioria desconhecidos. Lá entramos na casa do Menino, como gosto de chamar a este Santuário do Menino Jesus de Praga (ou de Avessadas!), e fiquei a conhecer o novo da diversidade: o Grupo GPS, as Flores, o Grupo Segue-me, etc… Mas logo essa diversidade se começou a tornar unidade quando foi preciso cantar, rezar, ler, meditar. Sim, É PRECISO! Porque a caminhada que tínhamos diante não era tanto até Tongobriga, era mais até ao interior de nós mesmos, onde colocamos os alicerces do edifício da vida. E, como diz Teresa, “a humildade é o alicerce do edifício” (V 22,11). E para chegarmos ao interior de nós mesmos e avaliar/colocar o alicerce da humildade é preciso a força, a coragem, a “determinada determinação” que só Cristo pode dar.
Guiados pela mulher do cajado, a “pastora” Cindy, e pelo senhor guitarrista, o Pedro, lá nos pusemos nós ao caminho. Até ao Castelinho. Logo ao início, fazem-se perguntas (do género: “pode-se falar ou isto é em silêncio?”), encurtam-se distâncias (dois dedos de conversa aqui e um empurrão ali nas meninas que vêm mais atrasadas) e lá se chega à primeira paragem. Foi a paragem do re(-)conhecimento: “É coisa muito sabida amarmos mais uma pessoa quando muito nos lembramos das boas obras que nos faz.” (Teresa de Jesus, V 10, 5). E, logo a seguir, uma carta de Jesus. Como diz um frade que conheço: tanta cousa! De facto, são tantas as boas obras que nos faz este Senhor! É este Senhor que entra pedagogicamente nas nossas vidas, não impondo-se mas derramando, das suas mãos cheias para o nosso dia-a-dia, acontecimentos e obras de tanta beleza e valor! Porque “a humildade é andar em verdade diante da própria Verdade” (Teresa de Jesus, 6 M 10,7), “a coisa” (como gosta de dizer o nosso Papa Francisco) ia a correr bem: desenhava-se diante de mim umas mãos abertas constantemente a dar.
E seguimos viagem! E seguíamos viagem à procura de uma pequena ponte, algures em Esmoriz. Mas… ãh?! Paramos junto de um grande poste. Bem, até eu comentei para o lado: se isto é uma pequena ponte… Mas só agora, à distância, é que se percebe bem: a ponte primeira e primordial só pode ser vertical: entre nós e Deus! Só depois dessa ponte, podemos construir pontes horizontais que tenham valor, proveito e sentido.
E isto leva-me à terceira paragem: nas primeiras pedras do complexo arqueológico de Tongobriga. Agora, à distância, se vê bem: pedras, número três (terceira paragem) só podia ser invocação do túmulo e da ressurreição, só podia ser o início de algo novo. E foi. Para mim, o novo, o sumo desta caminhada aconteceu aqui, quando li esta frase do nosso Papa Emérito Bento XVI na sua menagem para a JMJ2013: “Quem não dá Deus, dá muito pouco!”. Esta frase fez-me estremecer, mas guardei-a só para mim. Tinha que ruminá-la! Preferi partilhar outra frase: “A história mostra-nos muitos jovens que, através do dom generoso de si mesmos, contribuíram grandemente para o Reino de Deus e para o desenvolvimento deste mundo, anunciando o Evangelho.” A “coisa”, sentia eu, estava no dom, na entrega, mas faltava acertar o alvo daquilo que Deus me queria dizer. E enquanto cá dentro isto se passava, (tenho-me andado a esquecer que isto é uma crónica!), cá fora cada grupo partilhava as “impressões mais impressionantes” da Mensagem de Bento XVI para a JMJ2013. Depois de umas homilias mais ou menos breves, de umas palavras de apresentação do Papa Francisco, lá partimos para Tongobriga.
E chegou a hora do farnel: um rissol para cá, uns pacotes de batatas fritas e snacks para lá, um bolo de chocolate para cima, uns sumos para baixo e, entretanto, (para além de chegarem os de Aveiro e de Braga) umas boas gargalhadas, acompanhadas de umas músicas, conversas mais ou menos sérias e profundas e uns toques na bola (e algumas boladas!). E assim se ficou até perto das 16 horas.
Chegou, então, o momento de celebrar a Eucaristia. Se a Eucaristia é, de si, o ponto alto de toda a nossa vida, naquele dia tão especial - o Domingo de Ramos na Paixão do Senhor, que o Beato JPII institui como Dia da Juventude -, mais especial se tornava pelo facto de estarmos, como jovens carmelitas, a juntar-nos a todos os jovens do mundo que, naquele dia, celebravam a alegria de ser jovem cristão. E foi aí, no partir do pão da Palavra e da Eucaristia, que se me abriram os olhos, tal como aos discípulos de Emaús. Quando o frei João, na sua homilia, ia a partilhar a frase que mais lhe tinha prendido a atenção, numa sintonia estranha, comecei a partilhar aquela frase primeira que tinha guardado e que tinha andado a remoer dentro de mim: “Quem não dá Deus, dá muito pouco!”. E então percebi qual era a sms de Deus para mim naquela carminhada: que o desse a Ele, e não apenas a mim, mesmo aos outros! Percebi que até posso partilhar o que sou, o que tenho, o que sonho, o que penso; mas mais rico e mais prioritário do que partilhar tudo isso é partilhar/dar, depois e juntamente com tudo isso, Deus. E foi então que olhei para a caminhada que tinha feito e vi: afinal tinha andado a dar aos outros um “pedacinho de Deus” nas conversas e brincadeiras, nas músicas e nos silêncios, nas piadas e na oração. Reconheci que Deus tinha andado por ali, como os discípulos concluíram que era o Senhor que Lhes tinha falado pelo caminho.


Pronto! E lá voltei eu para casa, depois de algumas carrinhas avariadas, com o alicerce da humildade-verdade solidificado: eu tenho qualidades e coisas para partilhar, é certo!, mas, se apenas me der a mim mesmo a quem comigo se encontra, terei dado pouco. Há aquele refrão: “Tu tens que dar um pouco mais do que tens!”. A mim, apetece-me dizer: Tu tens que dar muito mais do que tens; porque o que tu tens é pouco quando comparado com Deus. “Quem não dá Deus, dá pouco!”
Obrigado a todos os que trabalharam com afinco para que esta XXI carminhada, apesar de tudo se realizasse e decorresse como decorreu; principalmente à coordenação do Carmo jovem e ao GPS. E peço desculpa a quem tanto esperou por esta crónica tão desajeitada, mais crónica da viagem interior do que da exterior.

A gotinha Renato 

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